quarta-feira

Dizer está sempre fora do que dizemos.



Dizer está sempre fora do que dizemos


Um.

Dizer está sempre fora do que dizemos
o ato se reproduz em deslocamentos
volta antes e me encontro depois
a língua se desdobra fora do contorno ao redor
dos teus lábios lentamente ao redor da sala meus passos

haveria na gaveta o esquecimento de papéis amarelados
em que não pude registrar e contornei as dobras
de um lado ao outro por personagens
sempre brandos que não viveriam na gaveta
porque a vida diferente do amor 
era sempre antes da janela e da despedida
enquanto esquecia os papéis me acenavam
esquecia as estações e o mar em marulhos
fustigando as leis do som como dois sóis
expelindo dentro da sequência de letras

nunca fiquei dentro do que sabia existir
o círculo do registro e o aceno
estou sempre fora do que digo
aceno na pele o que suponho melhor você

Dois.

Você disse
catástrofe enquanto eu me dirigia levemente
ondulante e distraída para a cozinha
depois do mar da praia do azul do invólucro
de pensar que caminhava sozinha sobre meus pés
você disse direcionava os olhos para as xícaras
postas no armário as xícaras de café da avó eu disse
e vestia dois panos orientais repetiu suavemente
após lamber os lábios de cima da letra
a catástrofe imaginei ser um terremoto na ilha
quantos milhares atingidos
a casa e suas memórias destroçadas
a letra muçulmana na memória subterrânea
as ânforas trincadas serenamente
nossa posterioridade em minha alma anterior perdida
um dia da paisagem do corpo
nem todas as civilizações nômades
pensei ser a melancolia de um homem
mas perdoei depois pensei ser a morte
mas não sabia meu corpo saliente
afundando no oceano

pensei o que não queria
mas depois todo coração ficou brando
a dor cabia lá acenando lírios
era sim estampada no jornal do dia
homens com lírios no peito
a guerra sem destinação e silenciosa
lembrei de como distendia
até que pousasse em quem nunca fui
uma assombração todos os parágrafos devem ser encerrados
a prosa de quando nada mais cabe
dentro quando um transbordamento sem destinação.

Três.

Você voltou e acho que eu não estava mais ali 
regressei e eles sabiam
de terremotos e vinganças
talvez tudo nunca tenha existido
eles silenciavam e previam
nem a ilha nem qualquer parágrafo de cremação
nem esse sonho em vigília
de uma catástrofe selvagem

apenas meu corpo que se via na praia naquela manhã. 











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