quarta-feira

Arremedo ao medo de não estar


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A primeira semente, vésper, o badalar do sino, a cidade se arrefece num duplo, apenas sou quem não me encontra, desdizer que refizemos os séculos e colheremos morangos fora da estação. Desdizer o não dito isto já semeia no embalo da rede. Precisei nascer antes que meus passos tomassem outros rumos, brisa leve já esqueci, primeira semente colhida no pântano alagado do olhar.

Parece simples jogo do ocaso essa voz que se artimanha nas sílabas ao meu redor, parece fácil supor que o lugar da origem esteja a beira de um precipício. Não a vontade de traçar contornos de arremedar a linha do horizonte de mapear as ruelas da cidade de minha adolescência, não querida, deixa o mar escorrer devagar, devagar no ritmo em que fizemos faríamos as preces das colheitas dessa estação, num canto uníssono os passos guiados ao sul. Arremedo ao medo de não estar.

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 Não são quebradiços vitrais dentro do olhar apenas os laços oblíquos onde festejo saber sua presença fora de mim. Estar a olhar o breve traço que se insinua e sempre me esqueço do momento, é aqui entre as válvulas salientes, este estar tão perto, movediço, chão onde não estanco mais. Descreves o ato e essa contracultura de eclipses e solares a embalar a rede teus olhos verdes.

Preciso da nota que lhe arranque do coração a compaixão de um enxame de humanos que falam a mesma língua, eu não os entendo, minha fala sonâmbula, tão antiga.


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Fácil supor o feminino em sua instância de afogamento, sobre as outras, para que irias querer uma mulher, para grifar suas mãos entre jaulas e cabedais de desculpas interrompidas. O amor se desfaz antes de iniciar, sei bem, sei bem chorar pelas tréguas desfeitas e pelos jardins de um inverno recolhido.

Dizer-me nego tudo tão já, me nego
E antes de negar sou mesma quem disse
Essa não palavra nostalgia ou saudades


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Só simplicidades no apenas entre a casa em redomas
Seus passos nus ao meu redor enquanto dissimulavas no tempo imperial
Olhe e apontava antes da nomeação
Um mapa impreciso, uma mapa antes da separação.
As coisas nunca são uma só, os acontecimentos nunca se dão sozinhos, uma sucessão antecede qualquer culpa. Agora entendes porque era mais fácil apenas um olhar leve para fora. Não haveria as limitações dentre esse local. A casa essa tanto que qualquer outra vez nunca pude contar, a casa antes e poderia dizer sem abalo sísmico, a corrente haitiana, perde-se tudo, não amores tão fortes, não há. Nesse lapso de tempo em que não estivemos, quando mesmo juntos somos como cegos dançando a matriz de um gozo impossível, existe o momento, o sinal antes da bomba, a cidade antes da invasão inimiga, o minuto que antecede a morte, ou o beijo, esse instante que você se esquece de captar e flui enquanto me ler. Simples e ao mesmo tempo elo complexo que antecede toda uma vida. 


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As primeiras letras são paisagens rupestres


    
 As primeiras letras são paisagens rupestres

o suspiro parece mais agudo alto
ouço pelas margens
altissonante até a vertigem das névoas destoadas
para essa emoção qualquer cura asa de vento
fuga ou minerais que cicatrizam as escavações
ferida em ouro brilhante.
                       
                            
era outra vez todo ouro retirado em cetim
o linho branco dos impérios
que atiravam em precipícios amores
por suas dores em cantos
espraiados pela peça de uma engrenagem
que faça rodas da dor
que faças curvas e peripécias ao destino.

Desenterrem as violetas e as rosas ainda por desabrochar
Qual mão chega a empunhar a bandeira de um desengano
A empunhar a faca para o corte da cicatriz mais profunda
Qual mão ainda confie cega que chega a adormecer
O mais singelo e perfumado sonho.

O corte brilhante daquele sangue espesso cicatrizei
com as nadadeiras de um mar profundo.
Quantas profundezas a sondar os mistérios.
Os minérios do pensamento.







 A cicatriz em que se insinua o gosto de amar

Os amores se insinuavam aos meus passos? Caminhar cegamente
com medo de reaver novamente aquele alto suspirar.
Só sabia findar numa espécie de perda secreta,
só sabia da pedra esverdeada do olhar
altissonante num vocabulário estrangeiro 
que sonha em outra língua. Só sei, sonhei com isso, 
as solas secas dos pés 
rabiscando o território da volta, voltaríamos para a casa seguros.
Voltaríamos para a casa seguros?
Amaria os naufrágios
Eu sei você também tem um mar inteiro dentro de ti
Haveria volta nessa mesma hora,
quando uma mulher, uma outra,
estudava o turismo de regiões terrestres,
preferiria os lados orientais, uma certa cultura em que ela achará panos coloridos para cobrir nas rendas de um vestido também em tons fortes desenhados. A mesma mulher me olhará de soslaio entre a saída e a entrada de alguma passagem do aeroporto internacional. Turistas embriões do mundo, nos todos, essa mesma, num espelho decifrou minha alma e tudo começou naquele instante. E me demoro a decorar o passado. A perda desse amor movediço em água e sangue e areias exiladas.
Esse amor se insinua, insinua-me a ele.