Seguiam a mesma direção. Escute: não
posso ficar, enquanto segurava uma trouxa de roupas foi se dirigindo pelo
corredor, chegando ao fim encontrei portas abertas. Parei, encostei a voz
precisava de paciência. Quase largo tudo e saio, mas deixou-me nessa noite
entre as coisas, as coisas aflitas fitam-me num giro como se ao redor delas
pairasse uma outra existência. Um sopro que com suas ondulações chamasse a mim.
Fujo naquela mesma madrugada e saio, continuo ladeira abaixo até o sol encarnar
nos olhos. Bambeio dentro do corpo, da outra vez supus a loucura, os
medicamentos pesavam e tremia ao sol. Ela dizia venha é quentinho um pouquinho,
precisava de mais ciência eu ficava dentro da casa e quase sempre vinha aquela
sutil aflição dos objetos em sombra lhe inspirando outra vida, existência leve
e superior. Calo o grito em silêncio maior, a ladeira abaixo.
Ousei falar de literatura,
desentranhar a poesia num mundo que eu não devia a mínima satisfação, doei-me
de corpo a escrita primeiro por prazer agora, por vício não tenho outra
solução, não há salvação, nem outro remédio, não falo de psicanálise. O que
falo de mim deseja falar em mim, algum desejo que me trai. Meus gestos
significam mais a você do que a mim que importa qual direção seguir: cavalo sem
rédeas. É nas esquinas onde espero, vontade de te levar nas praças de algum sol
de inverno, quando os movimentos aceleram detenho, tenho deixado muita coisa
pra trás.
Sabe o passado não esquece, as
feridas não cicatrizam e esse salgado forte na sua boca, as lágrimas que
escorreram, foi só para você saber que eu não esqueci, e faço como todos não
esqueço, atormento, me detenho em pequenas fagulhas e fragmentos seus e você
pensa que eu enlouquecia. Não, eu cavo as feridas, as provoco sabe? Você dizia
eu sempre destruía as coisas, prefiro assim, mas olhe, preste atenção em mim se
você me ouvisse não ficaria assim. Por todos os lados, acima abaixo me
procurando, cavo faço a casa na concha me encolho, não sei me defender, deve
ser por isso.
O vento na pele parece a sensação
mais pura e límpida já não estava por mim quem a seguia, era eu lamentoso e
ingênuo. Mas olhe, não enlouqueças, seja firme, qual voz saía lancinante a meus
ouvidos, o vento. Não atire esses cacos essa louça de cristal não deixe que a
luz desse sol se fragmente em nenhum ponto disperso, segue-a. mas ela contínua
numa eternidade me invadindo todos os poros, entregando o corpo caminhante e febril.
O olhar longe, estar onde, espairecia em fugas silenciosas quando nada detém,
nada segura desse tecido da vida. Eram suas as horas? Havia luz que te
acompanhasse? De mais ninguém, mas o que poderia a acompanhar, o tempo o
trauma? - horas que corriam imensa
intensas, adivinhava o céu.
“Não, eu ainda não abandonei essa
casa”. Volto, violentava o passado não por uma história mas por uma mulher, era inteiro em erosão
em fragmentos largados, restos e réstias. A imagem rebrilhava o espelho, olhava
em meus olhos e suspeitava a partida. Álbuns de fotografia, alguém a me chamar
no quintal de antigamente, são difusas as vozes. Não, eu nego a casa e vou por
essas trilhas, uma canta e carrega o condão da eternidade, outra repete e age,
outra dança na chuva. Nessa confio ainda que com aflição cega, aflição de
entrega, meu ser inteiro nas primaveras de algum cheiro de maracujá, rosas nos
cabelos de maio, junhos pelo rosto a tristeza enrugada nos cobertores da
espera. O que entregar quando vierem me buscar? Meu lar paira uma poeira, tudo
rebrilha e as coisa parecem tão quietas, mas se movem tudo parece possui uma
estranha delicadeza, tão frágeis quando o sol toca, tão silencioso quanto,
quando posso me possuir nesses passos que. Deixo a sala, abro as portas, deixo
a rua ladeira abaixo avisto o sem fim estou sem mim. Pelo menos, voltamos a
seguir a mesma direção.
* pequeno trecho de um conto que apareceu em papéis avulsos, soltos na gaveta.